Relações familiares e a «incapacidade para os atos da vida civil»

reflexões a partir de um caso de «não interdição»

Resumo

A interdição civil é um instituto do direito civil brasileiro, no âmbito do direito de família, que consiste em uma ação judicial cujo objetivo é a declaração de “incapacidade para os atos da vida civil” do sujeito a ser interditado que, a partir da interdição, passa a depender de um curador para gerenciar seus bens e sua pessoa. O foco desta pesquisa é refletir sobre as negociações envolvidas na tomada de decisão de dar início ou não a este processo judicial, a partir da perspectiva de familiares envolvidos em casos de uma possível interdição civil. Para este trabalho, como recorte do universo empírico, trago relatos de Jurema, residente em uma área periférica da cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, que acompanho desde março de 2014. Com isto, farei o exercício de falar da interdição a partir de um caso de “não interdição”, uma vez que, frente à possibilidade de dar início ao processo judicial de interdição de seu filho, ela optou por não fazêlo. Ainda assim, suas práticas em relação a ele – que hoje é morador de rua – muito se assemelham àquelas de um curador designado pelo poder judiciário, razão pela qual considero que tenha sido realizada aqui uma “interdição de fato”. Por meio de uma aproximação com a literatura dos estudos sobre a deficiência e também de teorias sobre o cuidado, busco, a partir das narrativas e práticas de Jurema na dinâmica de sua relação com o filho, problematizar questões que emergem desta decisão, principalmente no que tange a uma pretensa dicotomia entre cuidado e negligência. Isso porque acompanhar sua trajetória é, também, acessar histórias familiares muito amplas, que incluem questões afetivas, econômicas e morais, de tal modo que as noções de cuidado e economia familiar aparecem como importantes para este processo de tomada de decisão.
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